Depois do ensaio da banda interrompido a meio, o sentimento reciclado de ver que, dentro da lógica de uma cidade de passagem, é desta vez o meu amigo vocalista, Vítor Ferreira, a partir para outras paragens. Desliguei o baixo, cortando-lhe o som, mas o seu compasso ainda ecoa na minha cabeça.
Saímos depois para fora, se é que alguma vez estivemos dentro, entre amigos e ex-amigos, numa espécie de paz podre, de vidas irreconciliáveis, de papéis assumidos, sentindo a estranha certeza das voltas que a vida tem de dar para que tudo fique, exactamente, igual ao que foi. Lembras-te como era?
As conversas de uma sociedade doente, medicada para além da cura, a psiquiatria, a neurologia, os projectos de acabar mestrados inacabados, as festas trance, as saídas combinadas para daqui a três semanas, um hipotético concerto em Setembro, uma voz feminina a dizer que quando for para Moçambique dará um salto até à África do Sul.
A dispersão, o envelhecer em cada gole de cerveja, em cada baforada de cigarro, entre anéis de fumo em dedos celibatários, o flirt mantido há mais de cinco anos com uma rapariga de cabelo preto.
Voltei, mais uma vez, da praia. Acordo bem cedo para ajudar um amigo.
O espelho não mente a não ser a si próprio.
Há uns dias voltei a dar formação, as mesmas cenas de assertividade, estratégia de gestão de conflitos, comunicação e relações interpessoais. A quem engano eu? Quase que não comunico e as relações interpessoais, principalmente neste ano, tiveram a tendência em se afunilar em duas ou três pessoas, no máximo.
Passo as mãos pelos lábios. Estão secos.
Passei o início da noite em conversa com o tipo do café da frente. Falou sobre o que era a sua vida em França, do seu amigo argelino, do ter casado pela igreja apesar de não a frequentar. De que falei eu?
Procurei nos cantos da memória as lembranças de uma pessoa que amei. Encontrei muito poucas.
Nota- é Verão, o discurso ácido não pega.
Nota- a permanência dos cenários envelhece a história dos actores.
Nota- trocava anos de uma vida insonsa por 5 mnts de sal.
Nota- não obstante o verbo negro
Nota- não paro
Nota- nem me rendo