quinta-feira, dezembro 17, 2009


Em 1993 formei uma banda, ou melhor, fui formado e deformado por uma. Chamava-se Katacumba e era composta por quatro elementos: eu (baixo), JJ (guitarra), Xano (bateria) e Nuno Freire (voz). Não deixa de ser engraçado pensar que, mesmo tendo passados todos estes anos, ainda muitas pessoas se lembrem desses tempos. Éramos todos putos ainda, nos 17/18 anos. Posteriormente, lá para 1995/96, saiu o Nuno Freire e a Andrea Inocêncio passou a ocupar-se da voz. O baterista Xano saiu em 1997 e entrou o João Demétrio e, a partir dessa altura, seguimos outro rumo. De todas as formas, Katacumba terminou “oficialmente” em 1998, embora se tenham seguido diversos projectos. No entanto, nos 10 anos que se seguiram, onde as entradas e saídas de pessoas foram sempre uma constante, posso afirmar, sem nenhuma dúvida, que em nenhuma ocasião se conseguiu atingir um grau tão elevado de estruturação, entendido na forma como o “espaço da banda” era realmente contundente e construía (mais do que outras categorias que seriam muito mais pertinentes) a nossa identidade.

Este é um excerto de uma possível entrevista – autocentrada, subentenda-se, ou orientada a uma só voz.

- O que era ter uma banda nesses anos? Falamos de 1993, 1994…
- A questão nem será essa. A grande questão – se existe, visto tudo se tratar de questões menores – seria esta: o que era ter uma banda alternativa punk/hardcore/death metal/whatever na Coimbra dos anos 90.
- Ou isso, eu lembro-me bem desses tempos, não havia nada, os CD eram poucos, na maior parte das vezes ouvíamos as músicas gravadas de gravação em cima de gravação, basicamente dos Dead Kennedys, ou dos Sex Pistols ou dos Cramps…
- Sim… mas também Ratos de Porão, Napalm Death, Obituary…
- Ou seja, a banda tinha muitas influências musicais…
- Sim, podemos falar sempre de influências e, convém recordar, mais uma vez, que éramos todos putos de liceu, ou no meu caso e no do Xano, no primeiro ano da faculdade. Mas sim, se falasse numa banda que marcou os primeiros tempos de Katacumba essa foi sem dúvida os Dead Kennedys. Nem mais! O Jello Biafra! Posteriormente tive a oportunidade de ver os Dead Kennedys no Le Son, em 2003 ou 2004, mas sem o Biafra não era a mesma coisa. Já era o tempo da “pastilha elástica”.
- Eu entendo. Nesses tempos não havia nada, MP3, Internet muito menos, quanto mais Myspace ou quejandos. A música era mais vital porque não era tão imediata. Tínhamos que a procurar, fosse em lojas “mais que manhosas” de discos ou através de fanzines.
- Sim, mas as fanzines vieram numa segunda leva, numa altura em que a banda já estava muito próxima do universo do metal, embora a sua verdadeira essência nunca tenha sido essa.
- Explica lá isso.
- O início da banda surge da revolta de dois inadaptados na altura e de dois tipos “sãos” mas cheios de boa vontade. Basicamente é isso. Eu já tinha tocado anteriormente num projecto chamado In Extremis, em conjunto com o JJ e com o meu primo Pedro. Na altura não sabíamos tocar nada (literalmente) mas isso não nos impediu de irmos actuar no Scotch (Natal de 1991). Passado pouco tempo, o Pedro optou por ficar a tocar apenas com outra banda que se formou na altura, em 1992, os Foragidos da Placenta. Quando ele saiu, eu e o JJ ficámos sem baterista, até que apareceu o Xano, que tinha sido meu colega no liceu José Falcão. O Freire, vocalista, nosso amigo, entrou logo depois, outro dos tipos “sãos” mas cheios de boa vontade. Embora fossemos todos muito novos, a banda foi fortemente influenciada pelos últimos anos do cavaquismo e grande parte das letras, embora profundamente “naif”, ou ingénuas à la Censurados, eram de crítica ao sistema vigente. Melhor dizendo: a mandá-lo para o car****! Fundamentalmente era isso: as letras eram de crítica social, só numa fase muito posterior é que a banda cai num universo tendencialmente gore.
- O que contribuiu para isso?
- Não é assim tão fácil de definir, não de explicar. Tudo parte de uma essência, de uma semente, só depois os ramos escolhem as suas curvas sinuosas. A banda não era só música, era mais do que isso, não era só letras, era também t-shirts, preferencialmente estampadas com o símbolo DK, muitos litros de cerveja e amizades que nunca saíram da sua fase embrionária e não chegaram à idade adulta, Mira, Figueira da Foz, “chocolate”, etc. Embora o som fosse fortemente marcado pela bateria em estilo grindcore do Xano e pelo aumento da distorção da guitarra do JJ (na exacta proporção do material sonoro que ia adquirindo), o paradigma reinante era condicionado pelo “depressivismo” do Xano e pelo meu “negativismo social”. Pode parecer algo idiota de perceber, mas isso naquela altura fazia muito sentido.
- Pois.

(continua)

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2 Comments:

Blogger DarkViolet said...

A evolução da criação tem esses contornos; do desenho gaussiano se repetir sistematicamente, e ter a nostalgia no peito para transmitir sensações, a libertação

3:07 da tarde  
Blogger Black Rider said...

Uma catarse:) Ou antes, uma forma de (ME) recordar.

abraço

1:22 da manhã  

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