sábado, junho 25, 2005

Frase da constatação básica: "Excesso de razão é igual à ausência de toda e qualquer razão- por isso, raciona mais e raciocina e racionaliza menos".
A CONVERSA QUE SE SEGUE É DA i RESPONSABILIDADE DOS SENHORES QUE NÃO SE SEGUEM, e foi gravada em segredo numa casa de alterne (reed.)

- Por que é que vieste cá parar?
- Vim cá parar com o mesmo embrutecimento gradual, perda de sensibilidade...
- O que é que entendes por perda de sensibilidade?
- Não sei, antes ainda havia tristeza ou ódio, hoje só sinto embrutecimento.
- Algo de mau?
- Algo como ser mau. Ou pensar que posso caminhar para lá.
- O que é que é mais saudável?
- Tudo menos este desligamento obtuso. Sinto-me como num flipper.
- Quais são as soluções reais?
- Não existe realidade para existirem soluções reais.
LETRAS DE UMA SÓ PALAVRA
“Na dor, que é precisamente uma dor criada perpetuamente pela consciência que dela se toma, que se faz ser, que não é nunca suficientemente sincera, suficientemente dolorosa- todos os romancistas assinalaram a espécie de afectação que há em toda e qualquer dor, porque se faz ela ser, e a espécie de pesar por ela já não ser-, em qualquer dor há dor dos outros, a qual nós só vemos sob a forma que lhe dá o seu corpo, que é um objecto particular e que, nesse momento, nos aparece como um ser. Mesmo o sonho de uma dor é ser uma dor que é, e não uma dor que seja como consciência de ser”.

Jean-Paul Sartre, Consciência de Si e Conhecimento de Si

5 Comments:

Blogger Fata Morgana said...

Agora fizeste-me pensar num estádio de preparação para SER, em que inevitavelmente já se É.
A distinção entre consciência e conhecimento de si é fulcro, tantas vezes descurado, de muitas questões que geram angústia e confusão. Mas o existencialismo só pode ser radical mesmo.
Tu não achas?

8:10 da tarde  
Blogger Black Rider said...

Bem... já estive mais no existencialismo do que hoje em dia-de todas as formas acho que se deve fugir a todos os radicalismos, principalmente porque nenhum deles chega a ser assim tão radical.
Não acredito que exista um SER propriamente determinado ou que tenha chegado a um estado de consciência imutável. O momento definido e fixado no presente, nesse "É" não se mantém. Não acredito no SER, apenas no SENDO, no reflexo da acção que se projecta no tempo e no espaço. A evolução é isto, traduz-se na interacção dialéctica da identidade e da alteridade (e no serem ambas a mesma) e na mutação constante. Concordo com essa necessidade de distinção entre consciência e conhecimento de si, mas não a entendo sem o relacionamento com os outros- daí a "necessidade da dor"- a minha dor, a dor dos outros. Ou uma espécie de consciência/conhecimento em função dessa mesma dor. A exemplo do Heidegger "O tempo é (inter)accção e existe em função disso". De todas as formas, não é a minha área. Apenas me interesso e leio estas coisas.
Mas o conhecimento, ou a consciência, da dor não a mascaram ou apagam. Nem nada me garante que é através do conhecimento que se possa lidar com a angústia ou a confusão. Mesmo tendo em conta que a falta completa do mesmo só consegue perpetuar os efeitos negativos. O conhecimento pode fundamentá-los por outras e diferentes formas, daí o seu lado perverso. Mas isto é apenas especulação!
1 beijo meu para ti e uma excelente semana!

12:13 da manhã  
Blogger Fata Morgana said...

Precisamente. O conhecimento prova-nos quase a toda a hora que "aqui" não se está nada bem, só que é viciante e apetece sempre escavar mais fundo, mas é como diz o povo, "cada cavadela, cada minhoca"! Não quero com a minhoca significar "asneira"... mas sim angústia, desassossego, confusão. Claro que isso acaba por ser descoberto por quem tem miolos, não é preciso muita cultura livresca. Felizes os estúpidos! (Será?, não sei!)
Eu também detesto radicalismos. Talvez até devesse ser um pouco mais radical... mas não, sou demasiado compreensiva (no que respeita aos outros e a mim mesma) e aluada (no que só a mim respeita) para semelhante postura!
A ignorância é que já não me serve... Como se fosse um número que dantes calçava e, ora bolas! deixou de me servir e não tenho outro remédio senão crescer e sofrer. Mas sempre com um sorriso e a teimosia de acreditar que somos seres cheios de capacidades para fazer árduas piruetas e caír de pé, impecáveis, como se nada fosse - isto é uma imagem que me ficou de ter sido bailarina e dançar com os pés em sangue, nas sapatilhas de pontas, sempre com um sorriso, a nuca bem posicionada e de nariz no ar.
Também acho que SER é "ir sendo". O relacionamento com os outros é um doloroso cinzel... dói quase sempre, mesmo quando nos cinzela a curva mais bonita de todas. Mas acredito sempre que terminarei como uma bela estátua, cinzelada pelos amigos, amores, inimigos e opositores, graças à minha esquiva - pois não sou inerte como a pedra mármore. Compreendo-te! :)

1:54 da manhã  
Blogger Black Rider said...

É muito forte e bonita essa imagem da bailarina. E ainda mais intensa se torna porque, também, é um reflexo dessa mesma dor- os pés em sangue mas sempre com um sorriso no rosto. Desta vez sou eu que te entendo muito bem.
A ignorância também não me diz nada, mas o excesso de conhecimento, ou a procura do mesmo sem método, só acaba por distorcer, não sei. É como esta frase que atribuem ao Goethe (embora sem ter a certeza absoluta, mas cruza a sua filosfia ou dela se alimenta, não tenho a certeza): "Muita luz é como muita sombra. Não nos deixa ver". É preciso deixar o suficiente de luz e de sombra nas coisas sob o risco da sua completa invisibilidade.
Pelo outro lado, espero não me tornar numa estátua, cinzelada seja lá por quem for, pois sei que não seria aquele o meu rosto. Escrevi algures num desses vagos voláteis a que apelido poemas "as estátuas desiludem". Mas percebo o que queres dizer e compreendo-te. Vamos continuar a cavar mais fundo e fundo na terra até que, um dia, não sejam só as minhocas que nos venham parar às mãos.

3:18 da manhã  
Blogger Fata Morgana said...

Sobre a estátua cinzelada concordo contigo!
Claro que também nunca me gostaria ou reconheceria cinzelada por outros, nesse sentido de "pedra-inerte-e-fria", escultor e cinzel.
A imagem foi para significar a erosão, o trabalho às vezes terrívelmente mutilante feito à serra, a explosão, a implusão, a grandiosidade, o crescimento, a beleza também, a que estamos expostos ao interagir com outros (e só comigo também me cinzelo nesse sentido). Mas tu claro que percebeste, eu é que quis confirmar :)

2:04 da manhã  

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